São Paulo, 22 de Julho de 2006
Senhora,
Eu comprei todas as suas cadeiras, mesmo as desconfortáveis, mesmo as que ninguém mais queria. Mas, antes de mais nada, não comprei suas cadeiras por piedade, nem pelo medo de perder. Eu as comprei por que elas eram parte de você. Não, isso não me faz um cliente perfeito, mas, também, não faz de mim alguém que se mantém por perto por contrato, recibo, ou qualquer outro documento lavrado em cartório.
De algum modo, por mais estranho que pareça, não fui eu quem comprou suas cadeiras. Foram elas que me compraram, sem gastar um tostão ou amontoar dívidas. Não comprei essas cadeiras por você ser linda e porque seus olhos são verdes ou, mesmo, por conta do seu sorriso de "fico feliz em revê-lo, seja bem-vindo". Não comprei suas cadeiras pela aparência, mas porque sabia que elas sempre durariam enquanto você estivesse por perto. E cada detalhe que lhe faltasse, a cada dia escolhido, você trabalharia sua madeira, até que ela fosse perfeita.
Você me vendeu suas cadeiras, não por que eu insisti, nem por conta do meu sorriso torto, não foi por conta do meu crédito na praça ou meu jeito insistente de fazer o pedido. Não, você vendeu suas cadeiras por que acreditou que eu poderia cuidar delas, como se você mesmo as cuidasse.
Não sou cliente modelo, já disse, houve algum erro na minha entrega. Talvez tenha perdido tudo, tudo, tudo. Alguém deve ter levado suas cadeiras embora, mas eu não deveria ter esperado algo diferente, elas são as suas cadeiras, são únicas, especiais e, enfim, suas.
O que esperava? Eu tinha que gritar, tinha que colocar avisos em todos lugares que pudessem ver, tinha que colocar em cada poste de iluminação, eu tinha que saber se alguém viu as suas cadeiras e se alguém poderia me traze-las de volta. Sim, esqueci o mais óbvio, perguntar a você o que eu deveria fazer.
Estou com o recibo nas mãos, ainda. E ele diz que suas cadeiras ainda são da minha parte. De fato, ainda estão misturadas com as minhas e, sem saber, eu cuido delas como se fossem as minhas. E cuidarei melhor a cada dia; hoje, cuido melhor do que ontem, pode estar certa.
Será que você poderia me ligar, mandar uma carta, mala-direta, dizendo que quer suas cadeiras de volta. Ou, o que mais espero, me diga que você vai continuar por perto zelando por suas cadeiras e pelas minhas, como se nada tivesse acontecido. Por favor, vamos por um fim a esse embaraço comercial, seja para você levar de volta, de vez, as minhas/suas cadeiras.
Não tem porque ficar acordada de madrugada pensando para onde foram suas cadeiras, sofrendo sozinha, olhando velhos registros e fotos. Passando de vez em quando pela minha janela, esperando uma notícia. Nem tem porque eu ficar fazendo o mesmo, se o mais sensato é voltar atrás e fazer tudo acontecer. Sei que não faltam novos compradores para as suas cadeiras, mas, nem todos sabem que elas são especiais. Elas, em muitos sentidos, são você.
A verdade é uma só: suas cadeiras ainda são minhas cadeiras e as minhas são suas.
Só preciso de uma palavra sua, aquela especial que não se diz para quem não compra suas cadeiras.
Orgulhosamente seu,
Conrad Pichler.
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