Tecendo a manhã - João Cabral de Melo Neto

(Vila Velha, fevereiro de 2009)
Meu amigo e poeta Emerson Sitta (do blog Redigir) postou o seguinte poema de João Cabral de Melo Neto, publicado em "A Educação pela Pedra" (1962-1965) e, como o poema pede, eis que apanhei e lancei essa "manhã" a outros leitores:

Tecendo a Manhã

Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisa sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito que um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.

2

E se encorpando em tela, entre todos,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretendendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.
A manhã, toldo de um tecido tão aéreo
que, tecido, se eleva por si: luz balão.

2 comentários:

Anônimo disse...

Poema belíssimo!
Entretanto, vocês redigiram uma palavra errada no terceiro verso da segunda parte!!!
"entretendo".

O.S.

Conrad Pichler disse...

Caro/a O.S.,
Obrigado pela preocupação, eu tomei um susto, imaginando como que não percebera o erro, mesmo após várias leituras.
Mas, veja só: revisei o poema nas obras completas do poeta(Ed. Nova Aguilar) , e a grafia é essa mesma; parece-me um neologismo, que mistura "entretendo" e "entendendo" ou, mesmo, "entre-entendendo".

O poeta nos reserva algumas surpresas a cada nova leitura.

Abraços,
Conrad