Bicando em mim

Amarrar os homens com um filete farpado no leito. A chuva, a cheia, logo o charco se formará, encobrindo-os como uma lona. Os homens grunhindo e chorando abafadinho embaixo dessa lona pesada dormirão afogados.
Arrumar as trincheiras na mala aberta: massas de camisas dobradas e cuecas num canto apertado. Fechos serrados em metal no couro escuro. Com as duas mãos detidas no tempo, tapando o rosto, de pouco em pouco, provando as próprias lágrimas em cálice de suor.
Subindo a alta colina, cantando em trilha aberta, entre árvores tropicais, os homens acomodam e deitam as solas no terreno molhado, dos dedos palmilhados.
Descendo o teleférico pela encosta gelada. O homem só, a mala de couro só, as janelas de vidro, o gelo só; adormecidos na inanição do desejo.
Um tiro, um muro de tiros. Os homens desaparecem atrás das árvores, sob os arbustos, entre a grama baixa, no fundo do sangue, no meio das vísceras escorridas na terra. Só os olhos meditabundos do morto resistem descobertos.
Num rito, um menino abre, atrás daquela porta aberta derramada em linhas de luz inimiga, a mala violada na escuridão. Surpreende-se com as duas mãos escorridas de lágrimas que o pegam pela cintura, o abraçam sem vontade, o carregado de lágrimas.
- Eu não cuidei bem dos seus homens, eu fui bom pra eles.
- Vamos comer todo um bolo.
- Não me mata.
- Mas, vamos guardar um pedaço. Quando voltarem, eles vão querer comer tudinho.

(Conrad Pichler, versão abril de 2009)